Sentei-me com eles…

Sentei-me com eles

Sentei-me com eles, numa espécie de hemiciclo. Eram 20, entre os 10 e os 14 anos.
Disse-lhes que precisava de discutir com eles um assunto muito sério (ares de enfado, bocejos, numa espécie de hemiciclo, portanto).

Perguntei-lhes se costumavam eleger delegados de turma. Disseram-me que sim.
Quis saber a motivação na origem da escolha e quais as dificuldades com que se deparavam, no caso de existirem.
Ouvi as seguintes respostas:

“Às vezes é um bocado parvo porque não conhecemos bem as pessoas todas que estão ali. Devíamos votar só em quem conhecemos.”


“Às vezes não vamos todos a votos, só os que querem. E os que querem pedem-nos para votar neles e andam a tentar convencer-nos que são melhores.”


“De vez em quando são sempre os mesmos a querer ser delegados. Já quase ninguém quer porque não estão para se chatear muito com estas coisas.”

“Porque é que eu escolho um e não outro? Às vezes é só porque um é menos mau do que o outro, porque no fundo nenhum deles é grande coisa. Mas eu também não quis ser e alguém tem que ser, não é?”

“Eu acho que tem que ser alguém que saiba ouvir o que nós queremos e depois transmitir isso, exactamente isso. Ele ou ela são o porta voz da turma.”


“Tem que ser fixe, esperto, atento e que saber pelo menos mais ou menos o que quer fazer.”

“Tem que estar disposto a apanhar secas se for preciso.”


“Deve ser atento. De confiança. Não pode dar o dito por não dito nem ir para as reuniões dizer só o que lhe apetece.”


“Tem que saber ouvir o que queremos e às vezes tem que nos saber mostrar as coisas porque andamos muito distraídos.”

“Tem que ser alguém responsável e que tenha disponibilidade, vontade e paciência.”
“Eu acho que deve ser uma pessoa com à vontade para falar com todos, connosco e com os professores e os directores.”


“Deve ser alguém com espírito de iniciativa e alguém com capacidade para nos motivar quando estivermos a ir abaixo.”

“Também deve ser capaz de ter calma e capacidade para nos acalmar quando não estivermos a ser capazes de gerir um conflito qualquer.”


“Tem que ser alguém que não esteja à espera de receber recompensas pelo trabalho que se propôs a fazer. Se ali está é porque achou que era capaz de o fazer. “

“Deve ser organizado, activo, ter espírito de liderança e saber respeitar a opinião dos outros. Também tem que conseguir arranjar maneira de nos entendermos e de chegarmos ao melhor acordo possível.”


“Deve querer mesmo ser delegado e querer o melhor para a turma, saber ver o que está errado e tentar descobrir uma maneira de conseguirmos fazer o certo.”

Pedi-lhes que tentem, pelo menos, nos próximos quatro ou oito anos, não se esquecer do que acabaram de me dizer. Depois desta conversa tive, mais uma vez, a certeza que crescer dá cabo de nós. E de tudo o resto.


Autora: Cristina Gameiro

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